ACTAS  
 
01/09/2012
ASSEMBLEIA (exercício de simulação II)
 
Nuno Matias

Vamos dar início à segunda parte das assembleias da Universidade de Verão.

O sexto tema é Abolição das Touradas em Portugal. O Governo é o grupo Encarnado, a oposição 1 o grupo Cinzento e a oposição 2 o grupo Verde. Para iniciar o debate dou a palavra por cinco minutos ao ministro Henrique Barros.

 
Henrique Barros

Excelentíssimo senhor Presidente, senhoras e senhores deputados, o Governo esteve desde sempre comprometido com o aumento da tolerância e do progresso na nossa sociedade. Por isso, congratulamo-nos hoje em apresentar uma lei que finalmente vai fazer Portugal evoluir para melhor e que vai finalmente colocar um fim a uma política irracional e intolerante que nada de bom trouxe a Portugal.

Hoje apresentamos uma lei de abolição das touradas, que finalmente vai pôr fim a uma prática que tem tanto de bárbara como de irracional e degradante. Propomos a criminalização desde a contra-ordenação à pena-crime da actividade tauromáquica e de qualquer acto de violência injustificada para com os outros.

Sabemos que esta não é uma medida consensual, mas temos a certeza e a convicção que esta é a decisão que melhor serve os interesses dos Portugueses. Por isso, faço-vos o apelo do nobel e pacifista Elie Weisel que disse uma vez: "Tomem o partido, a neutralidade ajuda o opressor, nunca a vítima; o silêncio encoraja o torturador, nunca o torturado.”

Ainda assim, o Governo não podia ficar alheio às dificuldades que tal mudança pode acarretar para todos os que dependem das actividades ligadas às touradas. Assim sendo, esta lei vai ter um largo período de adaptação dando tempo para a reconversão dos profissionais da tauromaquia que assim desejem a novas actividades económicas. De igual modo, o Governo apoiará tecnicamente todos os profissionais e ainda estudará eventuais compensações. Perguntam os senhores, porque é que decidimos tomar uma decisão tão importante?

1 – Os animais têm direitos.

2 – As touradas estão associadas a um elevado grau de violência.

3 – Os benefícios económicos são baixos.

Partindo dos direitos dos animais é importante referir que já existe uma lei que protege qualquer animal da violência, à excepção dos touros. Existe uma excepção que permite ao Homem usar e abusar do touro, levando-o para grandes arenas onde está sujeito a todo o tipo de estímulos e provocações e onde acaba por sofrer: o animal é rasgado, perfurado, posto a sangrar e parcialmente asfixiado no próprio sangue.

Depois, antes de ser libertado pela morte, o touro vai ter que sofrer bastante tempo em sequência dos seus ferimentos. Sim, porque como qualquer animal, incluindo nós próprios, o touro é dotado de sentidos e emoções, percebe que lhes estamos a fazer mal, mas provavelmente o Homem é que não se apercebe que está a fazer mal ao touro.

Eu pergunto: o que é distingue o touro de qualquer outro animal? Não somos todos seres vivos? Não têm emoções e capacidades de sentir e sofrer? As touradas constituem-se desta forma como uma tortura protegida por lei, mas não deixam de ser uma clara violação dos direitos dos animais e mais do que isso, uma autêntica violação da tolerância e da moralidade em que a nossa sociedade que se diz ocidental assenta.

Além disso, as touradas constituem uma prática violenta, o que as torna um inimigo da sociedade porque violência gera violência. Sim, porque os estudos demonstram que o Homem tem tendência em se tornar naquilo que observa, por exemplo, se uma criança observar o pai em casa a bater na mãe ele tem tendência a produzir exactamente o mesmo comportamento quando for maior. E, pouco a pouco, vemos a nossa sociedade a tornar-se mais violenta e perigosa.

Muitos também afirmam que a tourada é uma tradição antiga e que por isso deve ser preservada. A esses digo que não podiam estar mais errados, porque nenhuma tradição destrutiva que transforma a vida em dor e sofrimento deve ser mantida. Porque se nos baseamos na Antiguidade, então devíamos ser todos a favor da circuncisão feminina em alguns países africanos.

Por outro lado, um touro precisa de dois hectares de terreno para poder crescer. Num país em adaptação não nos podemos dar ao luxo de utilizar terrenos desta forma tão pouco rentável para o interesse comum. Defendemos a utilização destes terrenos em zonas de agrícola ou de pecuária, assim damos muito melhor uso e teremos uma produção muito mais forte.

Se podemos produzir mais com algo que não envolve violência, violação e degradação da alma humana, por que não mudar?

Senhoras e senhores deputados, acabo como comecei: o Mundo sempre foi feito de tradições boas e más, que perduram e desaparecem. Cabe a cada sociedade, enquanto evolui, aperceber-se disto e decidir mudar e transformar-se. Numa sociedade justa, são impensáveis estas práticas eticamente e moralmente reprováveis.

Se queremos que os nossos filhos vivam numa sociedade mais tolerante e menos degradada em que os direitos de todos os seres vivos são respeitados e em que a violência é pouca, então esta é a medida certa. Um dia, Portugal vai evoluir e vai deixar as touradas. Hoje é o dia.

Muito obrigado.

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias
Muito obrigado. Tem agora a palavra o grupo parlamentar Cinzento por três minutos, o deputado João Estrela.
 
João Estrela

Excelentíssimo Presidente da Assembleia, excelentíssimos membros do Governo, senhoras e senhores deputados, a bancada do partido Cinzento posiciona-se obviamente contra este atentado à tradição.

Desde logo, os senhores atribuem a si próprios o direito de dizerem aos cidadãos o que é ou não Arte, o que é ou não Cultura, não tendo problemas em proibir uma tradição que vem muito antes de nós. Aliás, na vossa declaração enchem-na com juízos de valor. Os senhores até têm o desplante de chamar a uma actividade secular de culto de sangue.

Mas o problema não é só a questão ideológica. O que irá acontecer a toda a indústria que é lucrativa, ao contrário do que dizem, que está por detrás das touradas, nem contemplam isso na vossa proposta. Todos os postos de trabalho, todas as regiões que dependem em enorme medida do turismo tauromáquico, como por exemplo Santarém. Acerca dos hectares usados para criar estes animais, dizem que querem fazer muitas coisas com eles, mas na proposta de lei não está nada.

Como é que vão obrigar os criadores a parar a sua vida sem saber o que fazer com os terrenos? Por fim, ao ler esta proposta de lei considero ridículo que os senhores nem se tenham dignado a estudar profundamente o Código Penal. Sabem qual é a pena para um crime de coacção sexual? Até dois anos de prisão. Para um crime de sequestro até três anos de prisão. Pois bem, até três anos de prisão é o que os senhores consideram adequado para punir um artista.

Parece que, para este Governo, raptar ou assediar sexualmente uma pessoa, são tão ou menos graves que a morte de um touro. Este Governo quer ser responsável pela maior cornada de sempre na tradição portuguesa. [RISOS, APLAUSOS]

 
Nuno Matias
Muito obrigado. Tem a palavra agora o grupo parlamentar Verde, por três minutos, o deputado João Almeida.
 
João Avó Almeida

Muito obrigado, senhor Presidente. Senhor Presidente, senhor Primeiro-Ministro, senhoras e senhores deputados, o grupo parlamentar Zé Vide é defensor da cultura portuguesa e sendo a tourada uma tradição portuguesa somos claramente a favor desta.

Como os senhores lembram, no passado fomos contra os touros de morte, porque é um extremismo e nós não gostamos de extremismos. A posição que os senhores estão a tomar é de extremismos e dessa maneira não somos a favor dessa opinião.

Mais uma vez e como foi apresentado neste documento que está cheio de extremismos, volto a repetir, os senhores são a favor e há muito tempo que gostam de criar extremismos e estão capazes de acabar com uma das identidades culturais deste país, uma que é responsável por muitos postos de trabalho.

Neste momento em que nos encontramos com uma grande taxa de desemprego, os senhores estão dispostos a aumentar o número de desempregados neste país. Uma vez mais, os senhores vão ao extremo e dizem que nas terras onde se cria o touro bravo devia-se cultivar. São propriedades privadas, senhor Primeiro-Ministro.

Cada pessoa faz o que quer na sua propriedade privada. Está na lei e acho que os senhores deveriam saber e acho que sabem isso. Qualquer dia, os senhores dizem-me o que fazer no meu próprio quintal. Acho que não é aceitável. E mais, os senhores referem neste documento e para terminar linguagem que não é própria nem é precisa para se apresentar numa assembleia deste nível.

Acho que os senhores usam desde boi bravo até a bovino, pois, meus senhoras basta fazerem o trabalho de casa e apresentarem uma proposta melhor.

Muito obrigado.

 
Nuno Matias
Muito obrigado. Tem agora a palavra o Governo Encarnado na pessoa do ministro César Vasconcelos que tem três minutos.
 
César Vasconcelos

Muito obrigado, senhor Presidente. Senhoras e senhores deputados, tal como seria de esperar no sentido argumentativo a nossa proposta de lei está muito bem no nosso entender. Vocês surgem com a questão da tradição. A tradição não justifica tudo e mais alguma coisa. Nós tivemos, tal como referimos anteriormente, tradições boas e tradições más.

Esta é uma das más e há que alterá-la, abolindo-a. Nós também não somos desprovidos de inteligência e bom senso para acharmos que a tauromaquia e o seu mercado vão acabar de um dia para o outro. É isso que temos na nossa proposta de lei. Não acaba de hoje para amanhã. Damos um ano para esta solução ser executada, damos um ano para negociarmos com o mercado e a indústria tauromáquica para não lesarmos todas as pessoas.

Quanto aos terrenos próprios de cada um desses proprietários, nós promovemos que eles cultivem, mas se querem construir, ou cultivar, ou deixar ao abandono é problema deles e hão-de eles decidir. A questão é que não podemos continuar a deixar que se ande a promover o sangue e o sofrimento de um animal, que goste-se dele tendo uma carga robusta ou não.

A Cultura é como disse, há a boa e há a má, assim como a tradição. Vocês depois vão fazer o que pretenderem, vocês não, os proprietários, hão-de fazer aquilo que bem entenderem com os terrenos. Agora não podem dizer que não fomos conscientes ao ponto de dizermos é para acabar hoje e acaba-se hoje, não, negociamos, negociaremos e arranjamos uma solução com bom senso.

Quanto à questão da lei e das sanções. Nós aqui queremos realmente que não se voltem a repetir os espectáculos tauromáquicos. Portanto, temos de sensibilizar as pessoas pela lei e pelas sanções. É essa a nossa decisão e apelo ao bom senso do nosso povo para este problema.

E tal como diria Gandhi "a grandeza de uma nação e do seu progresso moral podem ser avaliados pelo modo como os seus animais são tratados”.

Sejamos evoluídos, sejamos grandes e hoje é um dia importante para o nosso país. Muito obrigado e boa tarde.

 
Nuno Matias

Muito obrigado. Terminámos então o sexto debate desta assembleia e que gostaria de saber por parte dos outros grupos quem venceu o debate. Nesse sentido gostaria que quem entende que quem venceu o debate foi o Governo levantasse o braço.

Parece que não há dúvidas absolutamente nenhumas de quem terá ganho o debate, portanto, declaramos vencedor o Governo Encarnado.

[APLAUSOS]

Passava então a palavra aos nossos comentadores.

 
Pedro Rodrigues

Muitos parabéns ao Governo. De facto também não tive a nenhuma dúvida de que o Governo pareceu mais consistente na argumentação. Aliás, a primeira intervenção, do Henrique, pareceu-me muito bem construída, uma argumentação muito equilibrada, sempre com a preocupação de, por um lado, defender a abolição das touradas, mas por outro lado gostei muito da ideia da requalificação profissional e da reconversão dos terrenos, embora se sujeitasse à crítica bem apanhada da oposição.

Relativamente ao Henrique, só sublinharia duas coisas: acho que foste muito agressivo. Volto aqui a sublinhar aquilo que há pouco falávamos do contraponto das senhoras e dos senhores neste debate. Foste muito agressivo, muito violento, como se estivesses a dar uma lição a alguém ou a bater a alguém, ou zangado com alguém. Quando na verdade não me parece que tenhas motivo para estar zangado com alguém. E foste pouco pausado, muito rápido e quando se faz uma intervenção tão longa como a tua, de cinco minutos, com muitos argumentos, se não és pausado às tantas perdemo-nos no teu raciocínio e não absorvemos cada um dos argumentos que estás a apresentar.

Portanto, dava-te essas duas notas: menos agressividade e um pouco mais de pausa, de sentimento, na intervenção que é importante neste tipo de intervenções que são muito racionais.

O João cometeu o pecado capital da postura que é muito comum: o problema das mãos. Mesmo os deputados mais experientes não sabem onde é que hão-de pôr as mãos e tu puseste-as no bolso. Puseste e tiraste, depois colocaste na mesa, apoiando-te e bem, corrigindo, mas acho que deves tirar nota disso.

Gostei imenso da forma como terminaste, salvaste a tua intervenção com osound bitefinal, foi agressivo, foi muito bem colocado, muito adequado e foi de uma acidez tremenda e o argumento do Código Penal pareceu-me muitíssimo equilibrado e bem agarrado. Queria só dar a nota de que pareceu que agarrou-se ao argumento do extremismo e ficou preso no extremismo.

Por acaso, depois o César veio-lhe dar razão. O César nalgumas respostas que foi tentando dar, designadamente à ideia da equiparação das penas do Código Penal, veio dar razão ao João com o que disse acerca do que queriam com as sanções. Para terminar, César, é de evitar o tom coloquial do ok, usaste, se não estou em erro, pelo menos três vezes e o ok não me parece ok nesta circunstância. Esqueceste de apertar o casaco. Ah, não dava!

[RISOS, APLAUSOS]

É a minha vez agora de dizer ok e gostei muito do teu tom sereno em contraponto com a primeira intervenção da tua bancada. Muitos parabéns.

 
Dep.Carlos Coelho

Entre as oposições o João Estrela esteve melhor que o João Almeida. Portanto, a oposição 1 esteve mais eficaz e com o sound bite "a maior cornada de sempre” foi feliz.

Aqui o case study é o Governo. Acho que a vossa votação é claramente justa o Governo merecia ganhar o debate. O Henrique e o César fizeram um par. Gostei mais da intervenção do Henrique do que a do César. Acho que a do Henrique teve melhor estrutura, mas gostei também do tom de voz do César, que foi fantástico, é um dote dele.

Cada um tem o tom de voz com que nasceu e o César nisso tem uma mais-valia, teve uma posição mais segura, uma pose mais serena, uma forma de falar mais pausada e isso deu-lhe profundidade e gravidade. O Henrique começou excessivamente grande eloquente, nos primeiros minutos olhámos uns para os outros e pensámos que ele estava a exagerar. A tourada também não é uma coisa assim. Começa a ganhar a assembleia a partir do segundo minuto, quando começa a sintonizar-se com a linha emocional das pessoas, isto é, quando começa a conseguir transmitir a lógica do sofrimento do touro, a malta começa a olhar para o Henrique e começa a pensar: ele pode ter razão.

A partir daí há uma mudança a meio. Não sei se o Henrique é seriamente contra as touradas ou não, mas a ideia que passa é que ele viveu aquilo que disse. Portanto, se é a sua opinião, muito bem, se não é, é um actor fantástico e conseguiu fazê-lo de uma maneira brilhante. Duas notas finais: primeiro, a primeira citação do Henrique é fraca, se a citação não tem força é melhor não fazê-la. O argumento só por si não se justifica. A segunda citação é assassina, é muito boa, de Gandhi, de peso e portanto das duas citações apenas a segunda vale a pena.

Última coisa: se a oposição não tivesse preparado o ataque antes e tivesse reagido, podia ter usado uma coisa que foi menos feliz do Henrique que foi comparar o sofrimento do touro à questão da circuncisão feminina que achei uma coisa perfeitamente de mau tom. Primeiro, por muito que gostemos dos animais não tem nada a ver comparar o sofrimento do touro com a agressão a uma mulher. Segundo, porque sei que alguns islâmicos consideram bonito falar na circuncisão feminina, mas não há nenhuma circuncisão feminina, a circuncisão é masculina, como sabem é tirar a pele, na mulher é a excisão, retirar o clitóris. É uma tortura sobre o corpo da mulher e é retirar um centro de prazer, é amputá-la de uma parte essencial da sua feminilidade.

Portanto, atenção aos termos, não há nenhuma circuncisão feminina há uma excisão feminina e compará-la com a questão do touro pareceu-me um bocadinho forçado. De resto foi um excelente exercício e o Governo mereceu ganhar. Parabéns.

 
Duarte Marques

Muito obrigado. Pedia que se levantassem e dessem os vossos lugares ao Governo do grupo Laranja, à oposição 1 do grupo Azul e a oposição 2 do grupo Castanho.

Agradecia que se sentassem, os que estão lá atrás, por favor.

Vamos dar início à sétima sessão legislativa desta reunião plenária. Hoje temos em debate uma proposta do governo que pretende o estabelecimento do voto obrigatório. Temos no Governo o grupo Laranja com o ministro Francisco Sousa Vieira. Tem cinco minutos.

 
Francisco Sousa Vieira
--texto retirado a pedido do autor--

 
Duarte Marques
Muito obrigado, senhor ministro. Dava agora a palavra à oposição 1, do grupo Azul o senhor deputado José Miguel.
 
José Miguel

Em primeiro lugar, queria cumprimentar a mesa e o senhor Primeiro-Ministro. Fico contente, fico contente por ver a sua preocupação. Passado tanto tempo, percebeu o fosso que criou entre eleitores e eleitos. Antes tarde que nunca, senhor ministro.

É importante dizer que o descontentamento e o fosso criado não acabam com leis. O descontentamento e o fosso criado, caríssimos deputados e Governo, com a mudança dos políticos e a mudança das políticas. Não são leis que podem mudar a cultura. Temos de ser nós próprios a mostrar o exemplo e a dar o exemplo.

A credibilidade ganha-se assim. Mas ganha-se também com uma oposição responsável, com uma oposição construtiva, e eu quero ser construtivo consigo e quero melhor para o meu país e digo-lhe: eu até aceito a questão do voto obrigatório. Posso aceitar, mas quero uma verdadeira reforma da sua parte, uma reforma onde todos os votos contam, porque o senhor fala em legitimidade, quer obrigar toda a gente a ir votar e eu digo-lhe: eu, eleitor, olho para os cinco, ou seis, ou dez e não gosto de nenhum, qual é a minha opção? Quero votar em branco, quero ter cadeiras vazias no Governo para aí sim, o senhor ganhar vergonha das políticas que tem feito e que têm aumentado o fosso com toda a gente.

[APLAUSOS]

Lembro-lhe que todos os votos devem contar. A democracia deve pertencer a todos e não só a alguns, mas digo-lhe mais: precisamos de mais democracia, mas é preciso mais coragem. Sei que é de um partido com bases fortes, mas acabe com a ditadura dos partidos, crie um sistema de voto preferencial. Eu, eleitor em Coimbra, não tenho de votar no cabeça de lista que Lisboa escolhe, quero uma lista ordenada por ordem alfabética onde eu digo quem me representa. Isso sim é ter coragem, é reformar a democracia e aumentar a democracia.

Lembro, para acabar, a todos os membros do Governo e a todos os deputados, que nós só podemos crescer, só podemos ser um país mais tolerante com menos assimetrias entre os ricos e os pobres, entre o Interior e o Litoral, quando tivermos mais democracia. Será sempre com mais democracia que seremos mais ricos e mais felizes.

Obrigado.

[APLAUSOS]

 
Duarte Marques
Muito obrigado. Dava agora a palavra ao senhor deputado Miguel Bugalho do grupo Castanho por três minutos.
 
Miguel Cruz Bugalho

Senhor Presidente da Assembleia, senhoras deputadas, senhores deputados, caros membros do Governo, o Governo apresenta-nos hoje uma proposta de imposição do voto obrigatório que todos devemos repudiar em nome da democracia.

O Governo afirma que esta proposta se destina a garantir o nosso sistema de Governo, diz que "as elevadas taxas de abstenção são causadas pelo crescente descontentamento da população para com os seus dignatários”, passei a citar. Imaginamos nós que se referem aos portugueses que votaram em vós e que agora se arrependeram.

Senhores deputados, não podemos permitir que o Governo desresponsabilize e desprestigie deste modo toda a classe política. O voto é um direito político e cívico, que deve ser exercido em consciência e numa determinada democracia madura em que se pretende que o voto em vez de ser uma obrigação imposta resulte sim de uma vontade reflectida e ponderada do eleitor.

A imposição do voto obrigatório diminui as estatísticas da abstenção, isso é verdade, mas reflecte-se numa participação mais activa dos cidadãos na vida política? Não. A imposição do voto obrigatório, senhores deputados, transforma o boletim de voto num formulário burocrático. Querem criar mais imposição arbitrária para os nossos cidadãos? Mais, a proposta do Governo erra por actuar apenas nas consequências e não nas causas.

Cabe a nós, políticos, o dever de chamar os cidadãos às urnas. O partido Governo parece esquivar-se dessa responsabilidade, mas eu garanto que o partido Castanho não!

[APLAUSOS]

Parece que o Governo se precipitou na apresentação desta medida, sem pensar nas respectivas consequências. A medida que o Governo propõe provoca, antes, um aumento indesejável de votos nulos e brancos. O que é compreensível, pois seria obrigar os cidadãos a expressarem uma vontade de eles não queriam.

Por outro lado, a obrigação de votar não melhora a qualidade da democracia. Os votos construtivos são aqueles que resultam de uma genuína vontade do eleitor. Por fim, ficámos estupefactos com a apresentação desta medida sem as excepções previstas sejam minimamente concretizadas e explicadas. O único voto obrigatório que existiria aqui era o voto de expulsão de vossas excelências.

[APLAUSOS]

 
Duarte Marques
Muito obrigado, senhor deputado. Dava agora a oportunidade ao Governo de responder às oposições. Em nome do Governo responde o senhor ministro Francisco Sousa Vieira. Tem mais três minutos.
 
Francisco Sousa Vieira
--texto retirado a pedido do autor--

 
Duarte Marques
Tem trinta segundos para concluir.
 
Francisco Sousa Vieira
--texto retirado a pedido do autor--

 
Duarte Marques

Muito bem, muito obrigado, chegámos ao fim de mais um debate. Fazia agora o exercício habitual de perguntar quem ganhou o debate, se foi o Governo ou alguma das oposições. Quem considera que o Governo ganhou este debate, levante o braço.

Muito obrigado.

Quem considera que foi a oposição 1, levante o braço. Parece-me óbvio que a oposição 1, o grupo Azul, ganhou este debate.

[APLAUSOS]

Dou agora a palavra aos nossos dois comentadores.

 
Dep.Carlos Coelho

Acho que a vossa decisão é correcta, a oposição 1 ganhou o debate. Sob o ponto de vista da forma não tenho nada a apontar. Acho que de uma forma geral vamos todos aprendendo com os exercícios e, portanto, aqueles pequeninos detalhes já corrigem: não houve nenhuma intervenção que não acabasse bem, com umsound biteforte, a postura física está boa, o tom de voz está bom.

O Francisco esteve melhor na intervenção inicial do que agora nas respostas, mas de uma forma geral está bom. Agora, o que acho que vale a pena assinalar neste exercício? É a habilidade política. Depois, nos comentários finais, farei uma referência a isso.

Tivemos dois momentos muito bons aqui. O primeiro foi o do Francisco logo na abertura. O Francisco começa a sua intervenção a justificar o voto obrigatório criticando o Governo anterior por aquilo que fez. Ou seja, é evidente que o grupo Laranja fez o seu trabalho de casa e pensou: o que é que eles me vão dizer? Se eu peço o voto obrigatório, eles vão-me dizer: os senhores estão a pedir o voto obrigatório, estão a dar cabo da democracia, ninguém acredita em vocês e agora querem obrigar os cidadãos a ir às urnas.

Para antecipar esse ataque, eles começam logo a definir um cenário que é dizer: o Governo anterior foi irresponsável, deu cabo da democracia, fragilizou a imagem das instituições, nós herdámos isto e por causa do Governo anterior temos de impor o voto obrigatório.

Portanto, foi uma forma inteligente de exportar a responsabilidade para o passado e sob esse ponto de vista significa que o grupo Laranja antecipou e pensou o ataque. Gostei muito dosound bitede que "os votos são o oxigénio da democracia”, acho muito bonito e muito bem dito.

O José Miguel foi brilhante. O José Miguel foi brilhante. O grupo Azul pensou: "O que é que vamos fazer?”. E em vez de dizer que era contra o voto obrigatório, surpreendeu-nos em dizer que concorda, mas não como o Governo queria. Disse que queria um sistema eleitoral diferente, preferencial, votar nas pessoas e não apenas nos partidos, portanto baralhou e o Governo não foi capaz de dar uma resposta a isso.

E sobretudo: "Não quero defraudar a vontade dos eleitores e se os senhores põem voto obrigatório quero que o voto branco tenha reflexo parlamentar”. Isto é, os cidadãos que não concordam com nenhum partido votam em branco e isso significa que há bancadas parlamentares que não são distribuídas nos partidos.

Quanto a mim, o José Miguel podia ser mais claro na formulação da proposta. Quem não está tão habituado ao argumento não teria percebido logo que os lugares ficariam vazios. Porque o argumento era dizer: os cidadãos que não concordam com nenhum partido e vão à urna votar em branco, devem ter esse voto respeitado, senão estão a confundir os votos e estão a dar aos votos brancos um mandato parlamentar que não era esse que os eleitores queriam.

Mas de uma forma geral, em termos de estratégia política foi brilhante. Ou seja, o grupo Azul construiu uma estratégia sagaz que é não fazer oposição frontal à proposta do Governo, mas pôr-lhe condições. Ou, para aproximar a proposta do seu modelo, ou para criar tantas dificuldades que depois teria pretexto para dizer: "Como os senhores não aderiram à nossa proposta, nós teremos de votar contra o voto obrigatório”. Muito bem feito, sinceramente, brilhante.

 
Pedro Rodrigues

Muito rapidamente, pois o Carlos já disse praticamente tudo. A construção do argumento foi brilhante do meu ponto de vista e acrescentava só um ponto: teve a habilidade de surpreender. A surpresa em política é determinante, a criatividade e a capacidade de surpreender é absolutamente fundamental.

Aqui, este exercício permitiu-nos perceber três coisas: que a mensagem política não é só forma, é também conteúdo; a estratégia política é tão determinante quanto o conteúdo e a forma como se transmite; e a capacidade de surpreender o adversário é tão importante no debate político, como aliás se viu. Porque o Francisco que esteve bem – gostei muito da primeira intervenção, embora ache que te perdeste a meio – nem sabia o que dizer. Não sabia, tentou de alguma maneira, mencionou o estado de alma que é uma coisa perigosa, perigosíssima.

Um membro de Governo transmitir o seu estado alma: se está triste, enfim, temos pena. [RISOS]

Portanto, ficou completamente surpreendido e não sabia o que dizer. Acho que este exercício foi extraordinário, porque permitiu-nos acrescentar a este exercício pedagógico que é para todos aprendermos, mais um ingrediente a que ainda não tínhamos assistido com tanta clareza nas anteriores assembleias, esta novidade da importância da estratégia política, da habilidade política, como o Carlos dizia, mas também da criatividade e capacidade de surpresa.

Parabéns a todos, pois foi um magnífico debate.

 
Nuno Matias

Muito obrigado. Pedia agora aos grupos que se posicionassem nos locais devidos agora para o oitavo debate: o Governo Bege, a oposição 1 Rosa e a oposição 2 Amarelo.

Vamos, então, dar início ao oitavo debate da assembleia da Universidade de Verão. O tema é uma proposta do Governo que visa a criação de um programa nacional de prevenção e combate à obesidade. Para isso, tem a palavra em nome do Governo Bege o ministro Miguel Rainha por cinco minutos.

 
Miguel Barroso Rainha

Muito obrigado, senhor Presidente. Excelentíssimo senhor Presidente, senhores membros do Governo, senhoras deputadas, senhores deputados, minhas senhoras e meus senhores, o ponto sexto do programa do XIX Governo Constitucional apresenta a criação de um programa de combate à obesidade no país.

Pouco foi feito nos anteriores Governos para combater o flagelo da obesidade. A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) já considera a obesidade como a epidemia global do século XXI. Em Portugal, este flagelo já afecta cerca de 29% das crianças. 29%! É preocupante, por isso temos de começar a trabalhar hoje, hoje. É importante também referir que o controlo da obesidade irá aumentar a esperança média de vida e consequentemente iremos conseguir aumentar a qualidade de vida dos cidadãos, que é realmente o que nós queremos.

Por todas estas razões, estamos aqui para apresentar um projecto que se define por cinco medidas e de seguida passarei a dizê-las. Este caminho será um caminho que resulta num ponto fulcral que será o controlo da obesidade em Portugal. A nossa primeira medida prende-se com um estabelecimento de um programa de reeducação alimentar. Este programa será fulcral, porquê? Porque nas escolas conseguiremos ensinar aos alunos como podem ter um quotidiano em relação à sua alimentação, saudável.

A nossa segunda medida defende o incentivo à prática de actividade física regular e controlada. É certo que é uma medida abrangente, mas esta medida irá também, certamente, aumentar a qualidade de vida dos cidadãos portugueses. É uma medida que pode ser desenvolvida.

A nossa terceira medida é interessante, passa por implementar um sistema de certificação universal na alimentação. O que é que quero dizer com um sistema universal? Quando compramos, por exemplo, um electrodoméstico, sabemos a sua classe energética; vamos aplicar o mesmo sistema para os alimentos. Torna-se universal, lógico e prático. O consumidor, se comprar um produto classe A saberá que ele é saudável e por isso mesmo, se em várias áreas de mercado existir essa classificação o consumidor irá comprar o produto mais saudável.

A nossa quarta medida pretende ser uma medida de sensibilização. As medidas de sensibilização são sempre medidas importantes, são medidas de contacto com a população, são medidas práticas e porquê esta medida de sensibilização? Esta medida de sensibilização irá ensinar a todos, de uma forma global, como se pode praticar uma alimentação saudável. Será essencialmente nos meios de comunicação: televisão, rádio, mas também nas actuais e muito importantes redes sociais.

A nossa quinta e última medida passa pelo acompanhamento médico e psicológico dos doentes. É uma medida mais abrangente e com esta medida conseguiremos melhorar a saúde pública e o sistema nacional de saúde. Porque se a obesidade é controlável nós reduzimos a longo prazo com os custos na saúde com a obesidade e conseguimos com a redução de custos implementar em áreas que são não de tão fácil controlo em relação à saúde.

Em suma, estas medidas permitirão uma diminuição do flagelo apresentado da obesidade. Consequentemente, com cidadãos mais saudáveis, com um bem-estar físico melhor e psicológico. Queremos evoluir, assim vamos evoluir, porque queremos mais qualidade de vida para os cidadãos portugueses. Queremos fazer os portugueses felizes.

Muito obrigado.

 
Nuno Matias
Muito obrigado. Tem agora a palavra, em nome do grupo parlamentar Rosa, o João Sousa. Dispõe de três minutos.
 
João Sousa

Muito obrigado. Senhor Presidente, senhores membros do Governo, senhoras e senhores deputados, a obesidade é um combate que deve ser travado, mas não é o Estado, num exercício que seria de uma hiperplasia e de um atentado à liberdade de escolha e individual que deve liderar este combate, dizendo aquilo que devemos ou não fazer.

O Estado não se pode substituir ao livre arbítrio das pessoas, o que seriam raras autocracias do passado e pior do que isso, pior do que isso, perspectivar uma para o futuro. O Estado não deve fazer escolhas, deve sim garantir que estas possam ser feitas de uma forma racional e consciente. Não é através de planos vazios e inconsequentes, que não passam de mãos cheias de nada, muito menos com medidas que já estão em vigor como e passo a citar: "acompanhamento médico e psicológico dos doentes”, que se resolve coisa alguma.

Reparem, senhores deputados, este acompanhamento já é feito em cerca de 15 hospitais.

Não é um, não são dois, são quinze hospitais com uma consulta específica para a obesidade. Sabe o que isto demonstra, senhor ministro? Demonstra desnorte, demonstra ignorância, demonstra incompetência. Trago comigo um gráfico – aqui está ele – onde se vê claramente que perante o aumento de rendimento há um decréscimo nos níveis de obesidade.

Por isso, o grande problema aqui, da obesidade, é um problema económico. Na verdade, não há sequer uma única referência no seu programa que apresentou. Repare no seguinte e atente ao meu raciocínio: nós somos pobres, não temos dinheiro para sermos magros e ainda pagamos ao Governo para nos obrigar a emagrecer com estes planos inúteis.

[RISOS, APLAUSOS]

É ridículo. É ridículo, senhor ministro! O senhor ministro está aqui hoje a combater a obesidade, esquecendo-se que o verdadeiro peso que asfixia os cidadãos é o peso do Estado. Esse sim, o verdadeiro balofo da nossa democracia.

[RISOS, APLAUSOS]

Gostava de acabar com a seguinte sugestão: para a próxima, numa lógica de poupança, essa sim uma verdadeira medida contra a obesidade, entreguem folhas brancas porque em termos de conteúdo pouca diferente existe.

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias
Muito obrigado. Tem a palavra agora o grupo parlamentar Amarelo, dispõe de três minutos, o deputado Miguel Pereira.
 
Miguel Santos Pereira

Senhor ministro, membros da mesa, senhores deputados, queria desde já agradecer as suas palavras, mas creio que há claramente alguns pontos que carecem de explicação.

Em primeiro lugar, queria que o senhor explicasse como é que pretendem fazer o acompanhamento médico e psicológico dos doentes e com que dinheiro. Ou vai acontecer como com os psicólogos que ainda por esta altura não foram colocados em escolas e na maioria dos casos deixam estas completamente à deriva e nalgumas situações em completo desespero?

E já agora qual é a opinião dos senhores de um nutricionista escolar com vista à identificação de casos problemáticos? Porque das duas, uma: ou os membros do vosso executivo não têm prestado atenção às medidas que o partido Amarelo tem feito ao longo dos anos acerca desta temática, ou claramente só estão preocupados com as questões superficiais deste tema e estão a distanciar-se do cerne da questão.

Voltando às escolas, o que pensam deguidelinesnutricionais a entregar às famílias destes jovens com o objectivo de fazer uma dupla intervenção, tanto de cariz familiar como escolar? Porque ao contrário do vosso partido, o partido Amarelo tem-se preocupado ao longo do tempo com a sua principal preocupação que é arranjar soluções para o problema e não apenas apontá-los.

[APLAUSOS]

Pude notar também que os senhores foram muito simpáticos, extremamente, com os americanos, porque esta proposta não é nem mais nem menos que uma espécie decopy paste, de uma réplica, de uma proposta do movimento americano dos democratas que serve de umlobbyaos democratas americanos no sentido de fazer passa ruma lei que por si só defende o interesse de determinados grupos em vez de defender o interesse nacional.

Ora, não somos americanos, por isso, meus senhores, queria apenas terminar a minha intervenção com uma sugestão: como não somos americanos pensem primeiro nos interesses portugueses, por isso, pensem à portuguesa.

Obrigado

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias
Muito obrigado. Dava agora a palavra ao Governo Bege, dispõe de três minutos a ministra Patrícia Ferreira.
 
Patrícia Ferreira

Senhor Presidente da Assembleia da República, senhoras e senhores deputados, excelentíssimos, agradeço muito que tenham levantado estas questões, são de facto muito pertinentes.

Percebo e compreendo os vossos pontos de vista e até poderia estar disposta a concordar convosco, no entanto não vejo nenhuma vantagem em que estejamos os três errados.

[APLAUSOS]

Meus caros, com os vossos argumentos só me fazem crer que não perderam mais do que uns minutos a analisar o nosso documento; felizmente cá estamos nós para vos elucidar.

Se do lado do consumo calórico existe um excesso facilmente se depreenderá que do lado do seu gasto existe um défice. Estaremos então num rigoroso incentivo à prática de exercício físico regular e de modo controlado. Apontamentos: ao grupo Rosa, ao senhor deputado, não estamos aqui a discutir o peso do Estado, estamos aqui a discutir as minhas medidas.

[RISOS, APLAUSOS]

Através das mais diversificadas campanhas, pretendemos demonstrar as consequências desta doença na qualidade de vida do doente, assim como os potenciais problemas de saúde advenientes da mesma. Faremos desenvolver todas as possíveis actividades preventivas destinadas a promover tanto hábitos alimentares como o exercício regular e controlado.

Queremos, nas escolas, professores capazes de diagnosticar situações críticas e com vista a tal, o fornecimento de formações, bem como material pedagógico relativamente ao tema pareceu-nos sempre fundamental. As taisguidelines, as tais directivas, o tal duplo controlo, quando disse que tínhamos de ter controlo em casa, está aqui, sim senhor. Devem ser …

[SILÊNCIO]

 
Eu acho que é importante para fazer uma defesa parlamentar do Governo dizer que estamos aqui…
 
Nuno Matias
Senhor ministro, eu não lhe dei a palavra.
 
Patrícia Ferreira

Relativamente ao financiamento desta nossa proposta, o simples facto de levantar a questão implica que haja da sua parte ignorância relativamente ao tema. Passando a explicar: o acompanhamento, o aconselhamento, o tratamento da questão da obesidade em Portugal será feito com recurso aos excelentes profissionais presentes hoje nos nossos serviços de saúde.

Apontou apenas os hospitais, falo de psicólogos, enfermeiros, especialista de nutrição, médicos de família, dispostos a ajudar as pessoas que sofrem com esta doença. Estes são perfeitamente capazes de acompanhar a implementação deste processo. Na eventualidade da adesão ao programa ser tal que os recursos disponíveis não sejam suficientes…

 
Nuno Matias

Muito obrigado.

[APLAUSOS]

Bom, dei mais alguns segundos, pois como perceberam houve alguma agitação na sala e tínhamos de dar oportunidade à senhora ministra Patrícia Ferreira de concluir um pouco mais o seu raciocínio.

Terminado o debate, queria então pedir aos demais grupos que pudessem votar em relação a quem entendem que venceu este debate.

Quem entende que venceu o Governo, por favor levante o braço.

Muito obrigado. Quem entende que venceu a oposição 1. Parece-me que é evidente que venceu o debate a oposição 1, o grupo Rosa.

Passamos a palavra aos nossos comentadores.

 
Pedro Rodrigues

Este exercício foi extremamente importante, porque trouxe-nos, ou deixou-nos, pelo menos duas mensagens que não sei se tinham ficado ainda muito claro nas anteriores assembleias.

O primeiro tem a ver com o comportamento e a performance das oposições. Assistimos aqui a duas técnicas totalmente diversas de como uma oposição pode abordar um debate parlamentar. Um grupo Rosa fez uma opção de confrontar totalmente o Governo, fê-lo com ironia, fê-lo com inteligência, fê-lo com graça, não abusando da graça, mas fê-lo com muita inteligência.

Gostei imenso da intervenção do João, só tinha dois pormenores: falaste em cima do microfone a certa altura e tiveste a tentação, enfim, começaste com a tentação de usar palavras difíceis (hiperplasia, etc.). As palavras difíceis podem em certos contextos demonstrar alguma erudição, mas no debate parlamentar não é boa ideia, porque estamos a falar para as pessoas e queremos ser entendidos.

Mas, enfim, ficaste pela hiperplasia e muito bem, não exageraste nas palavras difíceis e estiveste muito bem.

Depois, o Miguel usou um estilo e técnica completamente diferente e muito bem utilizada, do meu ponto de vista, que foi em vez de atacar o Governo foi fazendo perguntas, interpelando, mas interpelando com rasteiras, não era para o Governo ter oportunidade de responder, era tudotricky questions, tudo para "matar” o Governo.

Portanto, são duas técnicas, não é uma melhor que a outra, mas são duas técnicas que foram muitíssimo bem utilizadas e a segunda mensagem é de como os apartes das assembleias podem arruinar uma intervenção, que foi aquilo que aconteceu. A Patrícia não tinha começado mal, até acho que tinha começado muito bem, mas o aparte, sobretudo daqui do grupo Rosa que depois alastrou pelo resto da assembleia – que são as contingências da assembleia, absolutamente incontroláveis, é a magia das assembleias, portanto o orador tem de contar com elas e dominar –, arrasou completamente com a postura do Governo e a posição do Governo.

A intervenção da Patrícia ficou arruinada por esses apartes. Para terminar, só queria fazer um comentário à intervenção do Miguel: acho que abusou da teatralidade na sua intervenção. Dizia há pouco que é necessário usar de emoção e tons, mas o excesso de teatralidade, depois, conduz a que a audiência se centre nos tons de voz e nos gestos e se esqueça dos argumentos. Foi um bocadinho aquilo que aconteceu: eu, às tantas, já só estava a olhar para como é que estavas a gesticular e para a maneira como estavas a falar e os argumentos perdiam-se um bocadinho nos gestos e na teatralidade.

Portanto, acho que devias olhar para isso com alguma atenção, mas de resto gostei imenso do exercício, acho que foi extremamente pedagógico.

 
Dep.Carlos Coelho

Bem, numa análise muito subjectiva, gostei do estilo do João, acho que ele fez uma coisa brilhante. Porquê? Não gosto muito daquilo que tem mais sucesso no discurso político que geralmente é muito imagético e com muitossound bites, porque acho que tem falta de substância, mas reconheço que é eficaz. A minha função aqui não é dizer o gosto ou não, mas sim o que é eficaz e portanto tenho insistido que usem com alguma regularidade.

O João começa com um discurso muito sério baseado na questão essencial do princípio da liberdade individual, dizendo que o Estado está aqui a condicionar. Portanto, sob ponto de vista da argumentação o João começa com uma argumentação muito sólida e depois vai evoluindo no tom emocional com a piada de sermos pobres e ainda temos de pagar, é brilhante. O balofo da democracia é umsound bitegiro; o João vai em crescendo até à estocada final e de facto faz uma intervenção fantástica.

Para lá disso, do ponto de vista técnico esteve quase perfeito, a modulação da voz, o tom; esteve verdadeiramente bem. No resto, concordo com o que o Pedro disse em relação à Patrícia e o resto. O que é que eu não gostei na intervenção inicial do Miguel? O Miguel podia ter começado a defender o Governo com um registo emocional tocando na sensibilidade das pessoas. Ou seja, a primeira intervenção do Miguel parecia um professor de nutricionismo a falar, parecia um médico. Os argumentos eram de natureza técnica, não eram de natureza política.

Neste caso, por onde é que teria pegado? Teria pegado pelo maior problema que o mundo desenvolvido tem que é a obesidade infantil. Sei que o programa não era sobre a obesidade infantil, mas a ideia de que uma criança tem menos expectativa de vida, está a criar vícios desde tenra idade e problemas de saúde em todo o mundo desenvolvido. E há dados da campanha da Hillary Clinton: quanto é que pesa um bebé? Quantos quilos de carne é que um português come hoje com quatro anos e quanto é que comia há trinta anos atrás? Esses dados são públicos.

Portanto, eu teria pegado na obesidade infantil para dizer: os senhores estão a brincar, ou podem não ter sensibilidade, mas isto é o maior problema de saúde pública que o mundo desenvolvido tem hoje. Esse argumento que é um argumento de actualidade o Governo não pôs em cima da mesa.

Como a oposição não fez uma graça fácil, recordo-me que há muitos anos era o José Magalhães deputado do PCP, era o Professor Cavaco Silva Primeiro-Ministro e ele fez uma fez uma intervenção em que falou sete ou oito vezes no interesse nacional; o José Magalhães pôs o Parlamento todo a rir quando olhou, olhos nos olhos, da bancada do PCP para o Professor Cavaco Silva e disse: "Senhor Presidente, senhores deputados, temos um Primeiro-Ministro magrinho, mas grávido de interesse nacional”.

Esta piada podia ser mandada ao Miguel: é um ministro magrinho, mas preocupado com a obesidade dos seus concidadãos.

Muito obrigado.

 
Duarte Marques

Muito bem. Chamava o Governo Roxo aqui para cima, a oposição 1 do grupo Amarelo e a oposição 2 do grupo Azul.

Meus senhores, vamos lá a sentar, por favor. Bem-vindos à nona reunião plenária da sessão legislativa da Universidade de Verão.

O Governo apresenta uma proposta para a criação de um programa de investimento para promoção da energia nuclear.

Temos no Governo a senhora ministra Liliana Soares, tem cinco minutos para apresentar o programa.

 
Liliana Soares

Cumprimentar a distinta mesa na pessoa do senhor Presidente, cumprimentar os senhores deputados, aproveito também para desejar bons trabalhos nesta sessão legislativa, certa de que dará frutos em prol do nosso país.

Venho, então, apresentar perante os senhores deputados o nosso programa de Governo para ser sufragado por vossas excelências. Quero começar por uma das bandeiras da nossa candidatura, candidatura essa na qual os Portugueses depositaram tal confiança e nos fizeram obter esta maioria absoluta. Assim, vou falar-vos de energia nuclear, energia essa que é de extrema importância pois visa diminuir a dependência externa de Portugal, visto que o nosso saldo importador no que diz respeito a produtos energéticos aumentou 27,7% em 2012 face ao ano transacto, cifrando-se em 7,1 mil milhões de euros.

Acreditamos que o investimento da energia nuclear trará vantagens significativas para Portugal, pois permitirá a entrada no mercado caracterizado pela existência de monopólios naturais de agentes com tipos de produção de energia alternativos com vista ao aumento de concorrência nos mercados energéticos internacionais. Promovendo-se assim benefícios imediatos para o consumidor, diminuirá a dependência externa relativamente à energia, reforçando a soberania nacional e equilibrando, na medida do possível, a balança comercial e a dívida pública.

Incrementará a capacidade de exportação dos produtos nacionais, com a produção de energia nuclear de baixo custo estes produtos serão mais acessíveis no mercado interno, mais concorrenciais do ponto de vista internacional. Minimizará ainda custos energéticos em território nacional, colocando Portugal ao nível dos concorrentes internacionais e angariando capacidade de atrair investimento industrial estrangeiro.

Considerando os benefícios económicos que previstos na produção de energia nuclear que vimos referir, deve-se ainda salientar que no seu conjunto estes benefícios traduzir-se-ão numa janela de oportunidade para jovens cientistas, investigadores, cientistas e jovens físicos, os quais costumam abandonar o país para exercer as suas funções académicas lá fora.

E ainda para o consumidor e para o contribuir. Ademais, devemos enfatizar que no que diz respeito à energia em geral e à energia nuclear em particular o progresso do conhecimento científico e prático é sentido com especial impacto na sociedade.

A energia nuclear é um campo do saber caracterizado por desenvolvimento constante do conhecimento, encontrando-se em constante mutação e progresso. Na verdade, a busca pela máxima eficiência energética é o princípio director de qualquer explorador comercial de energia, que pretende sempre aumentar o seu lucro através da redução dos custos.

Lembramos, ainda, num verdadeiro apelo à história do mundo em que vivemos, que as revoluções energéticas estiveram na base das mais marcantes mutações sociais e económicas. Numa lógica e porque é eminente o lançamento no mercado de uma nova forma de exploração energética designada por fusão a frio na qual a energia transformada peloenergycatalyzer e que funciona apenas como hidrogénio e níquel em pó, impõe-se desde já capacitar Portugal com as ferramentas necessárias à respectiva produção em centrais adequadas para o efeito.

Numa lógica2.0, este tipo de energia tem como vantagens o facto de não libertar radioactividade, não necessitar temperaturas extremas, ser segura, limpa e renovável. Pretendemos, então, que Portugal seja paladino no investimento nesta nova energia, dando o exemplo ao resto Mundo.

Sendo esta uma energia limpa, é ainda uma forte resposta aos anseios das responsáveis preocupações ecológicas. É este o nosso projecto, é este o nosso caminho.

Muito obrigado.

 
Duarte Marques
Muito obrigado, senhora ministra. Dou agora a palavra ao grupo Amarelo, ao senhor deputado Nuno Montalvão que tem três minutos.
 
Nuno Montalvão

Senhor Presidente, excelentíssima ministra e senhores deputados, antes de mais queria dizer que ouvi com muita atenção o programa que este Governo apresentou aqui nesta assembleia e deixe-me que diga que este programa a ser aprovado, tenho a certeza, repito, tenho a certeza contribuirá para arruinar o nosso país e comprometer as gerações vindouras.

Senhora ministra, não sei se a senhora ministra sabe, ou terá a mínima ideia de qual é o custo que este tipo de infra-estruturas nucleares tem para o nosso país. Aliás, não é só o custo, para além do custo temos a manutenção, equipamentos, mas deixe que responda a essa questão visto que verifiquei que vocês não fizeram o vosso trabalho de casa como deviam ter feito. Ora bem, este investimento seria semelhante a construir um ou dois aeroportos, estamos a falar de milhões e milhões de euros, senhora ministra.

Porém, o problema não é esse, calma. É que se nós investíssemos hoje e o retorno viesse num ano, ou dois, ou cinco, ainda percebia, agora o retorno que nós teremos com este investimento só virá daqui a vinte ou trinta anos. Vinte ou trinta anos, senhora ministra.

Bom, com a grave crise em que nos encontramos, a meu ver faz muito sentido semear agora e colher daqui a três décadas! Por outro lado, referiram no programa um tipo de tecnologia que se chama fusão a frio. Do nosso partido e tendo em conta que o paradigma nuclear é bastante complexo, nós encomendámos um estudo e nesse estudo é inequívoco: não sei se sabiam que a grande maior parte da comunidade científica está contra a fusão a frio, mais, muitos cientistas dizem mesmo que ela é impossível de ser aplicada na prática.

Isto denota que esta proposta, enfim, é um autêntico tiro no escuro. Mostra uma falta de responsabilidade e sentido de Estado enorme, senhora ministra. Termino dizendo que contribua para que o país saia do poço em que se encontra e não que bata no seu fundo, senhora ministra. Assim termino, obrigado.

[APLAUSOS]

 
Duarte Marques
Muito obrigado. Dou agora a palavra ao grupo parlamentar Azul ao senhor deputado Jorge José.
 
Jorge José

Muito boa tarde a todos os presentes, elementos do Governo, senhor Presidente e todos os deputados. Depois de ouvir a sua proposta, fiquei a debater-me intrigado pensando se a senhora ministra não tem passado demasiado tempo pelas zonas de Paris. A dependência das energias primárias não é um problema de agora, certo?

Portanto, não tem de ser analisada onde há esse problema. Tem de se analisar o verdadeiro potencial de Portugal e não passa pela energia nuclear certamente. Basta ver que a Alemanha tem cerca de doze plantas nucleares, já fechou oito e tem tudo programado para fechar. Fala de aumento de concorrência do mercado nacional e de benefícios imediatos. Como disse aqui o senhor deputado, estamos a falar de um investimento muito muito grande, estamos a falar de 55,7 mil milhões de euros, o que dava para construir 55 pontes Vasco da Gama, se quiser.

Depois, pega em soberania nacional. Na área da energia, os senhores venderam a quota da nossa produtora e distribuidora de energia e pegam na energia nuclear para aumentar e refortalecer a soberania de Portugal? Depois, onde é que vai buscar esse fundo de investimento? Estamos a falar de dinheiro que foi emprestado pelo FMI a Portugal.

Portanto, porque já me está a acabar o tempo, acho curioso ter usado tantas vezes a palavra mutação. Eu até diria que gosta dessa palavra. A mutação não é só uma palavra, é uma consequência muito grave, não preciso de dar lições de História.

Gostei também das vantagens: não é uma energia limpa, cria resíduos e tem de criar estruturas para eliminar esses resíduos. E dando o exemplo de ser o paladino do investimento, não é assim, tem de dar o exemplo é agora e protegendo a saúde e a segurança e é a carteira das gerações vindouras.

Muito obrigado.

 
Duarte Marques
Muito obrigado, senhor deputado. Dava agora a palavra ao senhor Primeiro-Ministro Guilherme Correia, tem três minutos para responder.
 
Guilherme Canedo Correia

Muito obrigado, senhor Presidente. Senhoras e senhores deputados, convidadas e convidados, não me espanta que não concordem connosco, agora não virem preparados e oporem-se simplesmente para criar oposição, quanto a mim não faz sentido nenhum.

A energia nuclear é uma energia limpa, é uma energia que diminui substancialmente os gases libertados para a nossa atmosfera e acho que isso é positivo. É uma energia de grande escala, ou seja, uma só central nuclear é capaz de abastecer várias cidades, milhares de habitantes e é uma energia barata. O custo proporcional de uma central é absolutamente ridicularizado relativamente ao preço de energias fósseis não-renováveis.

E surpreende-me que diga, por exemplo, que nós devíamos preocupar-nos com o que a Alemanha faz. Os Estados Unidos e a China, duas superpotências – creio –, apostam cada vez mais em energia nuclear. Acabam de ser estendidas as licenças das centrais nucleares por 60 anos, nos Estados Unidos.

O investimento dos chineses em energia nuclear é significativo. Mas o que verdadeiramente me surpreende é a impreparação de vossas excelências. É que nós já temos um reactor nuclear cá em Portugal, um reactor de investigação, em Sacavém, com 300 trabalhadores. Ou seja, todo esse custo de que estava a falar e que só íamos reaver o nosso dinheiro em trinta anos; como assim? O reactor está feito, temos investigadores que sabem o que fazem, portugueses; não valorizam isto?

Queremos mais jovens a ir para fora? Não me parece. Mais, o facto de ser em Sacavém, próximo de Lisboa. São eleitores que vossas excelências não consideraram. Não conhecem os vossos eleitores, não criam uma política de proximidade. Isto é violentíssimo para a democracia. Nós temos que dar um uso sério ao nosso reactor nuclear de investigação, porque só assim teremos o risco acautelado, porque sendo usada claramente vai ter mais segurança.

Aproveito, ainda, para esclarecer os senhores deputados em relação a um aspecto que acho que é preponderante. O canal da Assembleia da República ainda está a emitir os nossos trabalhos e os senhores deputados darem o exemplo de impreparação aos milhares de Portugueses que estão a assistir a este debate é triste.

Muito obrigado.

 
Duarte Marques

Muito obrigado. Gostava de pedir ao público que votasse em quem ganhou o debate entre o Governo, a oposição 1 e a 2. Quem considera que foi o Governo que venceu?

Parece-me claro que o Governo ganhou este debate.

[APLAUSOS]

Passava agora a palavra aos nossos comentadores e despeço-me.

 
Dep.Carlos Coelho

Claramente o Governo ganhou, não tenho dúvidas nenhumas sobre isso. Devo dizer que foi surpreendente a evolução deste debate, sobretudo depois da aula do Engenheiro Carlos Pimenta, nunca pensei que este debate fosse travado nestas condições.

Acho que a oposição desertou dos argumentos fortes. O Governo foi muito inteligente. A Liliana esteve a roçar o brilhante, não apenas pelo bom tom de voz e postura, sob esse ponto de vista foi um exemplo daquilo que se deve fazer, mas pelos argumentos.

Quando a Liliana com aquela cara de santa nos diz: "Vamos apostar nas energias limpas, num nuclear limpo, porque temos preocupações ambientais e ecológicas”, é fantástico, quero dizer, a oposição devia arrasar esses argumentos e não o fez. O único que o fez foi o Jorge José e foi nos últimos trinta segundos.

Quando o Presidente da mesa diz que ele só tinha trinta segundos para terminar, o Jorge José lá disse que isso era uma treta. Foi tarde demais, era a primeira coisa e a outra coisa era dizer como é que o Governo está ao contrário da Europa toda. Quero dizer, está a Europa toda e grande parte do Mundo a fechar as centrais, a Alemanha, o Japão, quase toda a gente a desistir do nuclear e o Governo vem aqui propor exactamente o contrário.

Estes argumentos tinham de ser colocados em cima da mesa. Quem vem buscar o exemplo internacional é o Guilherme, que já na fase final já não tinha nada a perder e põe o exemplo internacional a favor dele, dizendo: "Vejam as grandes potências: Estados Unidos, China, Rússia”, que é uma coisa fantástica. Portanto, acho que aqui houve de facto um desertificar dos argumentos mais fortes.

Quando eles vieram já foi tarde demais. E depois o argumento das pontes Vasco da Gama que é o argumento mais forte que o Nuno invocou e depois o Jorge José pegou outra vez, é um bocadinho demagógico, sabemos, agora para fazer a comparação não é com coisas que as pessoas não sentem; comprar uma central com pontes? Agora, se fizerem com hospitais, centros de saúde, escolas, subsídios de desemprego, se calhar as pessoas sentiriam de uma forma mais evidente.

Acho que houve uma construção da argumentação que esteve longe daquilo que era desejável.

 
Pedro Rodrigues

Concordo inteiramente com o Carlos. Não me vou alongar muito, só dizer o seguinte: ficou muito clara mais uma mensagem. Se é certo que quem vem fazer oposição não deve trazer as intervenções fechadas para não serem surpreendidos pelos argumentos usados pelo Governo e depois, enfim, correrem o risco da desadequação da mensagem de ataque ao Governo, também não podem fazer o que fizeram que é vir completamente à espera de apanhar as fragilidades da intervenção do Governo que é para depois dizerem qualquer coisa. Isso não faz sentido.

Foi o que fizeram. De alguma maneira, aquilo que me pareceu, é que a oposição veio à espera do deslize do Governo e o Governo não deslizou. A Liliana foi de uma precisão absoluta. Concordo com tudo o que o Carlos disse, mas do ponto de vista substantivo usou todos os argumentos que tinha de usar, com muita clareza – desculpem a expressão –, não inventou e jogou à defesa.

Mais, não podiam fazer isso - perdoem-me essa frontalidade – porque o texto que o Governo trouxe trazia argumentos. Portanto, era perfeitamente previsível duas coisas: primeiro, que o Governo não ia deslizar porque tinha um argumento sólido, pois seria absolutamente inesperado que a Liliana fizesse uma intervenção que não fosse sólida quando o texto era sólido. Em segundo lugar, vocês podiam-se ter preparado com base no texto que o Governo vos trouxe.

Porque quando o Governo traz um texto talhado com toda a argumentação, vocês tinham de apanhar as fragilidades da argumentação do Governo para prepararem a intervenção contra o Governo. Acho que este exercício traz essa lição, é bom. É bom não fechar a intervenção quando se vem fazer oposição, é preciso dar margem para algum improviso ou adaptação em função da intervenção que é feita, mas não convém abusar muito disso, sob pena de acontecer o que aconteceu.

De facto, o Governo ganhou claramente o debate e o Guilherme ainda se permitiu no fim a acabar dando uma lição à oposição, dizendo coisa que me pareceu muito bem, embora depois tenha perdido no ruído final, a ideia de que isto está a ser transmitido aos Portugueses e portanto estão a dar uma má imagem a Portugal.

Acho que isso permitiu ao Governo não só ganhar o debate como dar uma lição à oposição desse ponto de vista. E, portanto, parabéns ao Governo e parabéns a todos, em todo o caso.

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias

Muito obrigado. Vamos agora para o último debate, chamava o grupo Verde para a mesa do Governo, o grupo Bege para a oposição 1 e o grupo Laranja para a oposição 2.

Vamos tentar ser rápidos. Peço aos outros grupos lá atrás que se vão sentando, por favor, até por respeito para com os vossos colegas.

Vamos então dar início ao décimo e último debate da assembleia da Universidade de Verão. A proposta que temos em debate é o alargar da limitação de mandatos a outros cargos políticos.

O Governo Verde estará representado pelo seu Primeiro-Ministro Simão Ribeiro a quem eu dou desde já a palavra, dispondo de cinco minutos.

 
Simão Ribeiro

Muito obrigado, senhor Presidente. Senhor Presidente, senhoras e senhores deputados, vivemos hoje num mundo novo, um mundo com novas necessidades, novas carências, e que, portanto, precisa indubitavelmente de novos actores na cena política.

Demonstrativo disto mesmo foi a dura e negra história da população portuguesa nos últimos 15 anos. Particularmente, nos últimos seis anos, aquilo que foi o desgoverno provocado pela vossa coligação Laranja-Bege que provocou qualquer coisa como 25 mil estudantes perdessem ou vissem reduzidas as suas bolsas de acção social escolar.

Só de Janeiro a Maio de 2011, caros companheiros desta câmara, para que tenham noção, este executivo de coligação permitiu a entrada a seis mil e quinhentos novos funcionários para cargos intermédios e superiores do Estado. Ficámos, em suma, com uma maior taxa de desemprego, com um maior défice com uma maior dívida pública de que há memória.

Partilho convosco aquilo que é já um apanágio de graça que de graça tem pouco naquilo que são as reuniões de Conselho de Ministro, costumamos dizer hoje, no Governo de Portugal, que cada criança que nasce nasce hoje sempre e claro com uma mãe, um pai e também com uma dívida gerada pela irresponsabilidade de governo destes senhores.

Mas, sabem o que espanta o Governo de Portugal hoje? Aquilo que nos espanta já não é a diferença entre a boa ou má gestão, aquilo que nos espanta já não é a diferença entre o amor ou o ódio na sociedade, aquilo que nos espanta é a indiferença generalizada com que os senhores se passeiam nos corredores desta câmara, como se nada fosse com eles, como se nada tivessem feito e nenhuma responsabilidade tivessem tido neste país.

Para que tenham noção, só nas autarquias locais a dívida pública atingiu os 9 mil milhões de euros, sendo que 2,5 mil milhões são dívidas geradas directamente pelo sector empresarial local. O sector empresarial local que não foi mais que um asilo político para o aparelhismo dos partidos políticos em Portugal.

E tudo isto, senhoras e senhores deputados, não foi obra de uma pessoa só, não foi obra única e exclusivamente de um presidente de um executivo municipal, foi obra de equipas de executivos, foi obra também dos vereadores. Costumo dizer que nestes sistemas políticos, os presidentes dos executivos municipais vão rodando e os vícios vão sempre, eternamente, ficando nas mãos dos que são sempre vereadores que controlam a máquina político-partidária.

Senhor Presidente da Assembleia da República, senhoras e senhores deputados, aquilo que a nossa proposta visa, simples e indubitavelmente, é uma nova narrativa, é um novo contrato de confiança entre aquilo que é a velocidade do desenvolvimento daquilo que é o social e a vida social neste país e a velocidade de desenvolvimento do facto e episódio político.

Aquilo que propomos é uma nova dinâmica eleitoral. Aquilo que propomos é um maior sentido de justiça e solidariedade intergeracional. Com esta iniciativa, com esta proposta legislativa, temos aqui e para dizer simplesmente um garante da rotatividade efectiva nos actores na cena política local.

Temos aqui o garante de que os jovens políticos de hoje, aquela que é a mais bem e melhor geração de sempre, terá um lugar nos centros decisórios da política portuguesa.

Senhoras e senhores deputados, o amanhã pertence sempre e sempre àqueles que trabalham afincadamente hoje. O Governo de Portugal sabe e sempre soube que não pode falhar e vos garanto que não falhará.

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias
Muito obrigado. Passo agora a palavra ao grupo parlamentar Bege, ao deputado Tiago Fiúza que dispõe de três minutos.
 
Tiago Fiuza

Muito obrigado, senhor Presidente. Gostaria de cumprimentar os senhores membros do Governo, as senhoras e senhores deputados, bem como todos os demais.

Senhor Primeiro- Ministro, constato uma vez mais que a qualificação intelectual do seu Governo é uma verdadeira nulidade. Em 2005, o partido Laranja maioritário e a quem deve pedir responsabilidades pelosboys for the jobs, pela dívida altíssima com que hoje nos deparamos.

[APLAUSOS]

Com a ajuda do tribunal constitucional conseguiu violar de forma evidente a Constituição ao estabelecer limites injustificados e desproporcionados ao direito a ter-se acesso a cargos políticos. Com isso, limitando a renovação sucessiva de mandatos dos presidentes das autarquias locais. Agora, numa segunda vaga, vocês também vêm propor o alargamento daquela medida aos demais titulares de cargos executivos locais, por pressuporem talvez a utilização de testas de ferro, como menciona na vossa proposta, a mando de vice-presidentes de autarquias.

Devo dizer, senhor Primeiro-Ministro, que a vossa proposta é ridícula, a vossa proposta afecta a vida dos cidadãos que contribuem positivamente para a causa pública. Aliás, a vossa proposta é, à semelhança da anterior do partido Laranja, verdadeira e insanavelmente inconstitucional.

Não se recorda, mas vou relembrar que todos os cidadãos têm direito ao acesso em condições de igualdade e liberdade aos cargos públicos – é o artigo 50 da Constituição.

Devemos garantir a liberdade de escolha dos eleitores, bem como a isenção e independência do exercício dos respectivos cargos. Mas compreendo, senhor Primeiro-ministro, que sintam alguma necessidade de limitar a acção dos nossos autarcas que de forma exemplar conduzem as suas populações, afinal o seu partido nas últimas décadas não conseguiu mais do que meia dúzia de autarquias.

Senhor Primeiro-Ministro, o caminho faz-se pelo rigor e pelo valor. Não negamos que certos políticos cometem atropelos à democracia, mesmo crimes, mas cabe-nos avaliar a performance dos autarcas no poder e os crimes, esses, devem ser investigados e não encobertos.

Não podemos, de todo, compactuar com a vossa pretensão, rejeitamos qualquer limitação adicional ao livre exercício de cargos públicos. Aliás, senhor Primeiro-Ministro, deixe-me que lhe diga que era capaz de apostar que da sua cartola sairão num futuro próximo novas proibições para presidentes da Assembleia da República, para membros do Governo, para todos, nós, deputados.

Já agora podíamos proibir que se candidatasse a outras autarquias, ou que estes nunca mais pudessem trabalhar na sua vida em empresas ou num dos milhares de institutos que acredito que o seu Governo gostaria de criar.

Vamos antes falar, senhor Primeiro-Ministro, do que é verdadeiramente importante e deixemo-nos de demagogia. Temos o voto dos Portugueses para honrar.

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias
Muito obrigado. Tem agora a palavra pelo partido Laranja, o deputado André Morais que dispõe de três minutos.
 
André Filipe Morais

Muito obrigado, senhor Presidente. Senhor Presidente, senhor Primeiro-Ministro e restantes membros do Governo, senhoras e senhores deputados, minhas senhoras e meus senhores, ouvi o meu colega de Parlamento a falar em cartolas, mas o que assisti aqui hoje foram dois partidos a sacudir a água do capote e mais nada.

[APLAUSOS]

O senhor Primeiro-Ministro, deixe-me que lhe diga, não é certamente laranja, porque os seus argumentos espremidos não dão sumo nenhum.

[RISOS, APLAUSOS]

Mas, senhor Primeiro-Ministro, voltemos ao início da questão. A actual lei de limitação dos mandatos restringiu a possibilidade de eleição dos presidentes dos órgãos executivos das autarquias locais. Restringiu um importante direito político. Sim, porque ser eleito é um direito. Reduziu também o arbítrio dos eleitores. Ainda assim, com ela concordámos.

Porquê? Porque alterou uma realidade negativa: a permanência prolongada no poder de demasiados autarcas, que não favorecia em nada a saúde democrática do nosso poder local.

Foi esta a realidade com que deparou a lei 46/2005. Neste sentido, foi considerado proporcional e adequado este diploma, porque promovia a rotatividade e a alteração regular dos titulares destes órgãos.

Ora, pretende agora o Governo estender esta limitação aos restantes membros eleitos dos executivos da câmara e da freguesia, esquecendo-se que ser eleito é um direito. O Governo pretende limitar, restringir, o direito de ser eleito sem prosseguir quaisquer valores ou bens jurídicos que visasse acautelar.

Bem sei que olhando ao facto de terem eleito o senhor Primeiro-Ministro e o seu Governo restringir a escolha dos cidadãos pareça apelativa, mas assim não se passam as coisas em democracia, senhor Primeiro-Ministro, o seu mandato não é um cheque em branco.

Argumenta que a anterior lei tinha subterfúgios, permitindo aos autarcas limitados pelo número de mandatos ocuparem os restantes cargos executivos. Senhor Primeiro-Ministro, tome nota, tome nota porque os autarcas portugueses não são testas de ferro, senhor Primeiro-Ministro, não são.

O seu Governo multiplicou-se em verdadeiros atentados contra o poder local por nele não ter a implantação desejada. Bom e agora? Agora volta a atacar. De cada vez que um jornal mediatiza uma questão política lá vem o senhor Primeiro-Ministro com uma lei numa mão e um discurso oco e vazio noutra, mas, senhor Primeiro-Ministro, desta vez tropeçou na nossa oposição.

O poder local é para nós um dos pilares da democracia e não, não, o inimigo predilecto de um executivo falhado. Por tudo isto, esta proposta não pode ser senão alvo da nossa veemente oposição. Ser eleito, senhor Primeiro-Ministro, é um direito e não cabe a si, ou ao seu Governo, aboli-lo.

Muito obrigado.

 
Nuno Matias
Muito obrigado. Tem agora a palavra, pelo Governo Verde, o senhor Primeiro-Ministro Simão Ribeiro que dispõe de três minutos.
 
Simão Ribeiro

Muito obrigado, senhor Presidente. Senhor Presidente, senhoras e senhores deputados, quero confessar aqui, realmente, que estamos perante aquilo que é talvez o maior facto estranhíssimo do comportamento eleitoral na vida de qualquer país civilizado.

Não consigo perceber como é que o povo português dá uma esmagadora maioria a este executivo governamental e dá duas câmaras exactamente ao mesmo partido nas eleições autárquicas. Pois, bem, ou há aqui um erro de interpretação, ou estamos com certeza a falar de países diferentes.

Passa a dúvida e é das dúvidas que nascem as discussões. Ó senhor deputado, "atentado ao poder local”? Deixe-me que lhe diga que o maior atentado exercido ao poder local nos últimos quinze anos e em particular nos últimos seis de democracia em Portugal, foi os seis mil e quinhentos funcionários do aparelho político da vossa coligação que foram à cunha, à força e a torto e a direito introduzidos na administração pública sem competência, sem rigor e sem nenhuma capacidade técnica para poderem lá estar.

Esse sim foi o verdadeiro atentado ao poder local. Mais uma vez tem de ser o Governo – não sei se seria efectivamente e por norma não é, mas terá que ser, com pena minha -, o Governo aqui, já que estão atados, tão envolvidos nas questões constitucionais, deixem-me dizer-lhe uma coisa: os mandatos do Governo, os mandatos do Presidente e da restante mesa da Assembleia da República não podem ser limitados por si porque são mandatos que emanam da Assembleia da República.

E os senhores deputados que tantos e tantos anos passaram nesta câmara deveriam saber que, ao contrário de muitos outros órgãos, a Assembleia da República, na sua função máxima de fiscalização precisa de deputados competentes e sobretudo de deputados experientes com capacidade de análise. Mas, há efectivamente e hoje ficou demonstrado uma grande diferença que nos separa. Há uma grande diferença ideológica e mal estaríamos se assim não fosse.

Mas há sobretudo uma diferença de atitude. Onde os senhores preferem pensar nos problemas, em pequenas cláusulas aqui e ali, nós preferimos pensar sempre e sempre nas soluções. Esta nossa iniciativa não é mais do que uma nova narrativa de confiança entre aquilo que é a soberania popular e as condições de decisão do poder político nas autarquias locais.

E, portanto, em suma, convido hoje todo o povo português, muito mais do que qualquer partido político, convido hoje todo o povo português a juntar-se a nós, àquilo que será o maior e melhor desígnio de salvação nacional, a salvação para aquilo que os senhores fizeram neste país para o estado de coisas que foi gerado pela vossa incompetência.

Muito obrigado.

[APLAUSOS]

 
Nuno Matias

Muito obrigado. Terminado o debate, peço agora aos grupos restantes que procedam à votação. Quem entende que ganhou o debate o Governo, peço que levante o braço. Muito obrigado.

Quem entende que ganhou a oposição 1, levante o braço por favor. Muito obrigado. Quem entende que foi a oposição 2?

Muito obrigado. Venceu a oposição 2 com 32 votos.

[APLAUSOS]

Passamos a palavra aos nossos comentadores.

 
Pedro Rodrigues

Vou ser muito rápido, mas há aqui duas ou três notas que eu queria deixar. Gostei muito deste debate, acho que foi muito vivo do ponto de vista da argumentação e do ponto de vista da forma, não o que o Carlos achará, mas eu achei quase perfeito.

O Simão esteve perfeito na forma. É o estilo de cada um, mas talvez acho que falou um ou dois tons acima, muito alto, mas enfim, de resto esteve perfeito. O André esteve absolutamente fascinante, esteve excepcional e gostei muito também do Tiago. Acho que na forma estiveram todos muito bem.

Porque é que acho que os grupos que não participaram no debate deram a vitória à oposição 2 e eu também daria a vitória à oposição 2, embora tivesse gostado imenso também do Governo? Porque o Governo, o Simão, adoptou uma estratégia inteligente do ponto de vista político, mas levou-a longe demais.

Ou seja, ele chegou assim e disse assim: vocês são os causadores de todo o mal neste país e nós agora vamos salvar o país com esta proposta. Mas qual é o problema? O problema é que é um bom ponto de partida, só que depois esqueceu-se de explicar a proposta. Esqueceu-se de defender a proposta, de fundamentar a proposta e a argumentação que ele usou para dizer que aqueles senhores é que têm a culpa do estado do país, não tem nada a ver com a proposta que ele apresentou.

Portanto, às tantas parecia que o Primeiro-Ministro estava fora da realidade, parecia que estava a falar de outra coisa e acho que a oposição apanhou muito bem isso. Sobretudo o André. O André foi absolutamente fantástico, porque centrou-se na questão. Começou muito bem com "sacudir a água do capote”, "não estou aqui para sacudir responsabilidades”, não sacudiu, assumiu e foi brilhante desse ponto de vista. Atacou as duas frentes, o Governo e a oposição, mas depois pela postura que assumiu não fugiu também ele das responsabilidades: assumiu a paternidade da lei, podia não ter feito porque entrámos no mundo da ficção, mas fê-lo com muita inteligência e astúcia.

Depois, foi ao ataque e perguntou várias coisas ao Primeiro-Ministro que o deixaram embaraçado logo a seguir. E porque é que o Primeiro-Ministro ficou embaraçado a seguir? Acho que o Simão foi melhor na primeira intervenção do que na segunda, porque se na primeira ele já estava um bocadinho fora da realidade, na segunda ficou completamente fora da realidade. Ficou surpreendido com a colocação muito clara da oposição.

O André pôs um ferrete, balizou a intervenção muito bem e o Simão quis balançar nas críticas ao Governo anterior e não se desenleou do colete-de-forças que o André – devo dizer – de forma magistral colocou. Devo dizer que eu próprio não sei como é que sairia desse colete-de-forças que construíste em três minutos.

Só para acabar, quero sublinhar isto – sei que estou a falar demais, mas isto tenho de dizer: o André deu aqui um exemplo de como é possível trazer argumentos preparados e improvisado. Foi notável, porque ele trouxe argumentos preparados com certeza, a intervenção estava bem preparada, estudou, a intervenção estava bem estruturada e solidificada, mas depois improvisou, improvisou imenso.

Fez aqui um exercício, devo dizer que se eu estivesse daquele lado não sei bem como é que me iria desembaraçar porque foi o André que colocou um colete-de-forças absolutamente fantástico. Parabéns ao André e parabéns a todos os outros, que foi um debate notável.

[APLAUSOS]

 
Dep.Carlos Coelho

Vou fazer dois comentários de natureza diferente. Vou comentar este exercício e depois tenho comentários finais sobre todos os exercícios. Primeiro, sobre este exercício, uma coisa que já devíamos ter dito quer eu e quer o Pedro, já várias vezes, e já aconteceu hoje uma quatro ou cinco vezes hoje, mas devo dizer que aconteceu muito menos hoje que nos anos anteriores, que é a utilização parlamentar do "vocês”.

O "você” é um termo perfeitamente possível na linguagem coloquial, quando não temos por confiança para tratar por "tu”, mas no Parlamento é uma falta de respeito. Posso dizer "a senhora”, " o senhor”, "vossa excelência” se quiser ser mais formal, mas não "você”. Portanto, "você” é um termo para excluírem do vosso léxico parlamentar.

Se calhar não devia dizer isso, mas nós devemos tirar partido do que somos e daquilo que parecemos. Se eu fosse uma senhora bem feita não me parece tirar mal da minha aparência. Não posso fazer isto de forma exagerada, para não parecercoquette, ou vaidosa, mas posso tirar partido do que sou.

O Tiago tirou muito partido da forma como ele se apresenta, tem um sorriso maroto, de jovem e a determinada altura coçou o cabelo – ele tem cabelo para coçar. [RISOS, APLAUSOS]

Isso pode ser estudado e deliberado, acho que o Tiago fez aquilo sem pensar mas dá uma imagem de jovem. Vocês todos podem projectar essa imagem de jovem, aquela ideia da simpatia, podem tirar partido disso. Para terminar as referências ao exercício que nós acabámos de ter, acho que o André foi verdadeiramente notável e acho que o Simão fez o exercício muito complicado porque ele quis criar um ambiente político e vendeu um cenário em que aliás ambos saíram muito bem, com o Tiago a dizer que não era ele, era o outro e depois o outro a dizer que estavam os dois a "sacudir a água do capote”, foi brilhante.

Acho que este foi o debate mais equilibrado de hoje, penso que qualquer um dos oradores esteve muito bem. O Simão ao fazer a ficção do cenário político, como o Pedro já disse, não fundamentou as suas propostas e esse foi o único erro do Simão.

Como estamos no último dia, se estivéssemos a falar na segunda-feira ou terça-feira eu não diria isto, mas como estamos a terminar a Universidade de Verão queria assinalar do Simão a modéstia em que ele se colocou. O Simão é, como vocês sabem, deputado da Assembleia da República, passaram pela Universidade de Verão muitos quadros que depois vieram ser deputados, mas nunca ocorreu que um deputado em funções se tivesse colocado por vontade própria na função de aluno da Universidade de Verão.

[APLAUSOS]

Três comentários finais sobre tudo o que fizemos: este foi tanto quanto me permite a minha memória o melhor exercício de assembleia de sempre na Universidade de Verão. Vocês tiveram um trabalho notável a preparar osdossiers, fundamentaram as vossas intervenções iniciais, estudaram argumentos, tiveram contundência sem cair no exagero fácil, no populismo balofo; fizeram um trabalho notável.

Ainda assim, pode acontecer que alguns de vocês estejam desiludidos com a prestação que tiveram, que saiam daqui com a ideia de que podiam ter feito melhor, que estejam tristes por não ter ganho uma votação. Isso é perfeitamente humano e ainda bem que assim é, porque significa que saem daqui com a vontade de fazer melhor da próxima vez. É possível que alguns de vós tenham pela primeira vez entrado numa lógica de debate parlamentar e, portanto, que não estejam habituados ao tipo de debate que fizeram aqui. Se isso for o caso, lembrem-se que isto é como andar de bicicleta: a primeira vez que nos metemos em cima da bicicleta aquilo parece uma coisa assustadora, a segunda vez andamos aos ziguezagues, a terceira vez já conduzimos bem, a quarta vez já tiramos uma mão e quinta vez já andamos sem mãos e tudo parece mais fácil.

 
Pedro Rodrigues
Há uma anedota em que se tiram as duas mãos e a seguir fica-se sem dentes.
 
Dep.Carlos Coelho

Ah, não era nessa anedota que me queria fixar.

[RISOS, APLAUSOS]

É fundamental que vocês percebam isto: quantas mais vezes fizerem um exercício, mais segurança terão na próxima vez. A segunda coisa que vos quero dizer é que provavelmente houve tensões dentro dos grupos. Tinham de distribuir equitativamente as oportunidades de intervenção e admito que os grupos tenham chegado a este dia e dizerem que não querem certa pessoa mas sim outra porque tem mais jeito ou porque falou menos vezes.

Pode ter havido tensões ou não, é natural que tenham havido a escolher oradores ou a definir a estratégia, ou argumentos, ou a fazerem os vossos documentos, pensem o que é a tensão ao nível político ao escolherem o grupo parlamentar, ao escolherem as direcções ao nível nacional, ou ao fazer escolhas do Governo. As escolhas que sofreram no vosso grupo são seguramente muito menos relevantes do que aquelas que têm quando tiverem de exercer o poder a sério.

Finalmente, para terminar, é bem possível que alguns de vós tenham considerado cruéis, desajustados, ou errados os comentários que eu e o Pedro fizemos ao longo desta tarde. É perfeitamente possível, porque a percepção que temos quando falamos é sempre diferente da das pessoas a quem falamos. Agora, posso garantir-vos uma coisa: o critério de juízo do Pedro e do meu será seguramente mais simpático do que o critério dos vossos eleitores, porque em democracia quem nos julga são os nossos eleitores.

E, às vezes, temos a convicção que estamos a dizer coisas muito bem ditas e os nossos eleitores não têm essa percepção. A única coisa de que me esqueci de voz dizer no "Falar Claro” é uma verdade elementar no mundo da comunicação, que é que aquilo que nós dizemos não é aquilo que nos sai da boca, é aquilo que entra no ouvido das outras pessoas. Aquilo que dizemos não é aquilo que queremos dizer, é aquilo que os outros percebem.

Conto sempre uma situação que aconteceu comigo numa intervenção que fiz na Assembleia da República quando era deputado, há muitos anos, em que falei do recrutamento de doentes. É isto que está na acta da Assembleia da República. Poderão achar o conceito um bocadinho absurdo, mas perceberão melhor se eu vos disser que estávamos a discutir o sistema de ensino.

Portanto, o que eu disse foi recrutamento de docentes, mas a menina, ou menino – eram quase sempre senhoras, que faziam a transcrição dos debates –, aquilo que ouviu foi recrutamento de doentes e por absurdo que fosse sobre o sistema de ensino eu falar de recrutamento de doentes, aquilo que ficou nos anais da história parlamentar foi este vosso careca a dizer um disparate monumental.

[RISOS, APLAUSOS]

Que sejam muito felizes na vossa vida parlamentar, são os desejos que o Pedro e eu vos endereçamos.

[APLAUSOS]

 
Duarte Marques

E a mesa da Assembleia, a Dr.ª Assunção e eu queríamos agradecer.

[RISOS, APLAUSOS]

 
Nuno Matias
O que vale é que ninguém acredita.
 
Duarte Marques

E queríamos garantir-vos uma coisa: nós cometemos menos erros na condução dos trabalhos do que na realidade. Queria agradecer ao Carlos Coelho e ao Pedro, mais em particular ao Pedro pois o Carlos já faz parte, o Pedro também faz parte da mobília porque tem estado em várias edições, mas registar a excelência dos comentários, que a mesa atesta, e sobretudo o empenho com que o fizeram e a disponibilidade para o fazerem e a sensibilidade com que o fizeram.

Se repararam, ao longo da Universidade de Verão, tiveram aqui vários ex-presidentes da JSD, o que abriu foi e o que vai fechar também. Estes dois também foram, o Pedro Pinto também foi e outros que cá estiveram como convidados, como o Carlos Pimenta, foram todos muito importantes na JSD.

[APLAUSOS]